Oficialmente apresenta-se como objectivo
principal da remodelação a procura de eficiência e eficácia na governação, mas
dificilmente vai-se deixar de notar que também se tratou de dar expressão
formal ao ganho em peso político conseguido até agora pelo ministro das
Finanças Olavo Correia, evidenciado publicamente no processo de elaboração do
orçamento do estado e na gestão de dossiers sensíveis como o da TACV. Já os
outros ajustes vêm na sequência dessa nomeação e da necessidade de repor
equilíbrios políticos. A questão crucial é se os sinais enviados para a
sociedade realmente convergem para passar uma mensagem de confiança que há
visão e competência governativa para equacionar e resolver os extraordinários e
complexos problemas que o país enfrenta no presente e próximo futuro. E é essa
mensagem que o país precisa neste momento quando se encontra numa encruzilhada
e tem de mudar de rumo porque “alguém” esteve a “esticar a corda até
o limite” e comprometer o futuro com políticas que deixaram dívida pesada,
o país sem competitividade, com capital humano inadequado e com um sector
privado fragilizado.
A verdade é que a divisão do anterior
ministério da economia em três ministérios e a absorção de alguns dos seus departamentos
no ministério das Finanças pode outra vez trazer à tona a ideia de que a
economia continua a ser “filho de um deus menor” nos governos
caboverdianos. Aliás, o facto de ao longo de todos estes anos ainda não se ter
melhorado significativamente o ambiente de negócios, baixados os custos de
contexto, delineado um plano de acção para a diminuição dos custos de factores
e resolvido o problema dos transportes deve-se em boa parte à ausência de
vontade política resoluta para remover os obstáculos institucionais, combater
os interesses que beneficiam do status quo e criar incentivos geradores de uma
nova atitude na actividade económica. Os avanços da economia informal, as
fragilidades no ambiente de concorrência e a relutância de muitos em correr
riscos e em desenvolver actividade empresarial são prova disso. Fica-se com uma
ideia das dificuldades em implementar reformas económicas notando, por exemplo,
que o governo anterior do PAICV, em quinze anos, teve sete ministros de economia, mas só três
ministros das Finanças. Por isso, qualquer sugestão de perda de peso político
no sector, quando o mais urgente para o país são as reformas económicas, não
pode ser tomada como uma boa notícia.
A expectativa de muitos é que logo à partida
o ministro da Economia fosse coadjuvado por secretários de estado com capacidade
tecno-política para planear a reforma profunda dos sectores sob tutela com
vista a uma organização moderna e efectiva da economia nacional. Levou a melhor
a opção por um governo pequeno fruto da ideia peregrina que é poupando no novo
grupo dirigente que se começa a dominar uma máquina ineficiente, cheia de
vícios e agressivamente hostil a reformas. O resultado é o que se vê. As
tentativas de mudança arrastaram-se, a autoridade tende a diluir-se no afã de
se conseguir controlo com os parcos recursos disponíveis e as reacções do
sistema em forma de fugas de informação, reivindicações salarias e greves não
tardaram a surgir. O número de passeatas, de confrontos laborais e greves já
verificados nestes 19 meses de governação
já deverá ter ultrapassado o que aconteceu na década anterior.
Aparentemente nem há muita ponderação em certas tomadas de posição. O caso da
Polícia Nacional em greve nos próximos dias pela primeira vez na história do
país e depois de ter sido contemplada com aumentos significativos no orçamento
para fazer face a reivindicações salariais antigas e progressões e promoções,
não deixa de ser estranho. Experiências de outros países alertam sempre para a
importância de manter foco na governação e mostrar capacidade de liderança para
fazer as reformas no momento certo a fim de não ser apanhado por interesses
corporativos e outros instalados em certos sectores da administração pública ou
ligados ao Estado.
A situação do país não é fácil e os vários
anos de estagnação tiveram impacto nas pessoas, aumentando incertezas em relação
ao futuro. Há que gerir as expectativas para que a atitude certa seja a de as
pessoas cooperarem entre si para o seu ganho pessoal e para o bem do país e não
caírem na tentação de cada um procurar “arrebatar” para si próprio o máximo que
puder dos recursos públicos. Para isso conta muito num mundo tentado pela
pós-verdade, pela demagogia e pelo populismo insistir numa governação honesta.
Convém também pôr em devida perspectiva a situação do país, sem cair na
tentação de usar o passado como arma de arremesso político, confrontar os
muitos projectos ilusionistas que ainda dominam o discurso político com a
realidade crua dos factos económicos e mostrar ser capaz de rever políticas,
traçar outras estratégias e desencadear iniciativas realistas que ponham o país
no caminho seguro do desenvolvimento. A resposta ao fiasco da CEDEAO, por exemplo,
não devia ser, sem qualquer avaliação prévia, a criação de um ministro-adjunto
para Integração Regional junto do primeiro-ministro. O país já não tem mais
folga para ilusões, titubeações e teimosias.
Humberto Cardoso
Texto originalmente
publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 839 de 27
de Dezembro de 2017.
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