segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

2012 – O despertar do protesto



 

Nº 579 • 31 de Dezembro de 2012

EDITORIAL:  2012 – O despertar do protesto
O ano 2012 foi marcado em vários países por eleições que evidencia­ram a insatisfação dos cidadãos relativamente aos resultados e métodos da governação e às falácias e ilusões disseminadas pelos líderes. A exem­plo do que acontecera em 2011 a participação nas campanhas teve muito do movimento popular interventivo no estilo do “Occupy Wall Street” e as vitórias foram em muitos casos (França, Grécia e Estados Unidos ) para os que propunham estilos renovados no governar. Nos casos como na Rússia, em que os velhos métodos de Putin ainda vingaram protestos subsequentes, demonstraram que se anseia por uma outra relação com o Estado, um objectivo para o qual cidadãos de Myanmar, unidos por Aung San Suu Kyi, deram passos significativos neste 2012.
Em Cabo Verde as eleições autárquicas deixaram claro o descon­tentamento progressivo da população para com o Governo. Quebra de promessas, falhanços repetidos em resolver problemas de emprego, se­gurança, energia e água e ainda exemplos de favoritismo e partidarização do Estado contribuíram para minar a confiança das pessoas. Já as eleições presidenciais de 2011 tinham sido afectadas pelo mesmo fenómeno. No ano de 2012 outros acontecimentos designadamente a manifestação do dia 1 de Junho, promovida pelas duas centrais sindicais e a oposição quase unânime dos operadores económicos e dos sindicatos aos aumentos dos impostos e a certas medidas preconizadas no Orçamento do Estado para 2013 vieram confirmar que a descrença se alastra.
Do governo ainda não veio sinal de que procura ajustar-se aos novos tempos de maior contestação às suas políticas. Viu-se na discussão do OE de 2013 em como não cedeu aos pedidos para ponderar as medidas a se­rem tomadas com potencial efeito perverso no emprego, no rendimento disponível das pessoas e na economia em geral. Mesmo nos casos onde recua, como é o dos vistos dos turistas e do investimento necessário para assinatura de convenções de estabelecimento com operadores (passou-se de 20 para 10 milhões de contos), a impressão com que se fica é que não se trata de flexibilidade, mas sim de “trabalho feito em cima dos joelhos”. O que parece comandar é a vontade de arrecadar receitas a todo o custo, resultante de uma perspectiva estreita e de curto prazo que não acautela a economia real que é a base de receitas presentes e futuras.
Neste ano do vigésimo aniversário da Constituição da República de­via-se ter bem presente que a democracia e a liberdade implicam relações entre os governantes e os cidadãos na base do consentimento destes e do dever de responsabilidade e de prestação de contas daqueles. As crises por que passam as democracias na actualidade têm a ver com a percepção de que se está sob o efeito de políticas ditadas por entidades supranacionais e não eleitas como a troika, a Comissão Europeia e os mercados de ca­pitais ou tomadas por governos à revelia das pessoas, suportando-se em maiorias partidárias subservientes e em máquinas de marketing político. Nos países em que as instituições democráticas são mais consolidadas essas crises eventualmente serão resolvidas restaurando o princípio basilar de que “o governo é do povo, pelo povo e para o povo”. Nas novas democracias tanto poderá verificar-se um recentrar com novas eleições como um agravamento da situação mantendo-se o governo com postura cada vez mais iliberal, menos respeitador dos procedimentos constitu­cionais e avesso à assunção plena de responsabilidade.
Nos últimos tempos os cabo-verdianos têm consistentemente dado sinal de que o país precisa de uma cidadania mais activa. Em matérias como eleições, direitos de consumidores e regionalização sente-se o peso crescente da participação de cidadãos. A exemplo do que se passa em outras partes do mundo não se está a deixar tudo para os partidos. As reacções, porém, nem sempre são benévolas. Há que evitar tentativas particularmente do Estado e de outras entidades públicas de absorver ou cooptar iniciativas de cidadãos. As democracias precisam do pilar fundamental que é uma sociedade civil forte e autónoma para se con­solidarem.
Encontrar vias para o país e para as suas empresas e as suas gentes se adaptarem a uma situação internacional difícil e imprevisível nos seus contornos a médio prazo pressupõe atitudes de governantes que não a arrogância e o autismo. A libertação da energia, da criatividade e da capacidade de iniciativa necessária só se verifica quando se respeita a liberdade, o pluralismo e o primado da lei e se compensa o mérito. É isso que as nossas falhas e o sucesso dos outros vêm demonstrando. Forçar o governo a reconhecer que assim é, devia ser central para movimentos de cidadania no ano 2013.
O Expresso das Ilhas deseja-lhe boas entradas e um Ano Novo feliz e próspero.


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