domingo, 20 de março de 2011

Triunvirato na direcção do Estado

A intenção de levar para o Estado a cumplicidade política que sempre existiu entre o Presidente do PAICV e os seus dois vice-presidentes Manuel Inocêncio e Basílio Ramos coloca problemas sérios. O sistema político tem como fonte de legitimidade directa as eleições partidárias para a Assembleia Nacional e a eleição suprapartidária do presidente da república. Da configuração de forças no parlamento extrai-se uma solução de governo completando o trio de órgãos de poder político na área de soberania. A relação entre esses órgãos orienta-se obrigatoriamente pelo princípio constitucional de separação e interdependência dos poderes. Assim, a actividade legislativa do Governo e do parlamento é controlado via o exercício do poder de promulgação do presidente da república que pode vetar os diplomas apresentados. O governo e o parlamento são concorrentes na produção das leis mas à A.N. é reservada de forma absoluta competência para legislar sobre certas matérias. À oposição no parlamento é dado o poder de bloqueio com a exigência que matérias bem determinadas exigem maiorias qualificadas de dois terços dos deputados para serem aprovadas. Ao PR, ao PM ao Presidente da A.N. e a outras figuras do Estado como o Procurador Geral da República e ao Provedor de Justiça faculta-se a possibilidade de recorrer directamente ao Tribunal Constitucional a para fiscalização da constitucionalidade das normas. A par da actividade legislativa, o parlamento fiscaliza o Governo e a Administração Pública, podendo instaurar inquéritos basicamente sobre qualquer matéria . O PR por seu lado, exerce ainda o seu papel moderador do sistema no seguimento que dá às propostas do Governo de nomeação de personalidades para altos cargos do Estado. No funcionamento do sistema é de maior importância que haja lealdade institucional, mas não cumplicidade. Cumplicidades roubam os órgãos de soberania da sua autonomia e do poder de fazer “checks and balance” ao sistema. A cumplicidade de semanas atrás em que se viu a A N a esconder o veto do PR para depois vir dizer que não havia tempo para confirmar diplomas aprovados pela unanimidade dos deputados, deixou mal o presidente da república e o parlamento. As instituições falharam por razões de pura conveniência política. O plano do PAICV de transpor o triunvirato do partido para os três órgãos de soberania traz consigo o perigo de se ver repetidos episódios como o do veto presidencial. É o que acontece quando esbatem-se os contornos e os limites de actuação de cada um deles. A dinâmica do sistema pressupõe uma certa tensão que não deve desenvolver-se em crispação permanente nem, muito menos, quedar-se por um consenso cúmplice que rouba aos seus titulares o sentido de integridade, de dignidade e do bem servir ao país e à república. A ir-se por esse caminho restará somente a Oposição democrática para fazer o contrabalanço do sistema e manter o Estado longe das medidas discricionárias e arbitrárias que ameaçam a liberdade e a autonomia de indivíduos e colectividades públicas e privadas. Mas só a oposição não chega. Fundamental ter-se uma sociedade civil autónoma e participativa, uma imprensa livre e comprometida com as liberdades individuais e o constitucionalismo e um poder judicial independente e célere na administração da justiça. E, no ambiente assim criado, ver-se emergir todos os dias uma maior consciência individual e cívica dos cidadãos suportada no respeito pela dignidade pessoal e na valorização da honestidade e verdade.

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