quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Memória e posteridade

As nações nos seus feriados, monumentos e símbolos como a bandeira, o hino e armas celebram a sua existência, avivam a memória e passam à posteridade o sonho de uma vida “até ao fim dos tempos”. O contrato social que une todos numa vivência comum é particularmente renovado nesses momentos em que todos se reúnem em comunhão. Faz-se então a reafirmação dos princípios basilares que norteiam a nação e justificam as instituições que medeiam a relação entre o indivíduo e o colectivo e entre governantes e governados.

Liberdade, Independência e Democracia são as grandes aspirações dos povos e nações em todo o mundo. Nos calendários nacionais são as grandes datas escolhidas para as comemorações em que toda a “polis” se reúne com uma só voz independente das suas divisões políticas ou outras no quotidiano da sua existência. Uma outra data de celebração colectiva que aparece em muitos calendários é a da Memória e Gratidão por actos superiores de indivíduos que tiveram papéis cruciais em momentos críticos da vida da nação ou, pelos seus feitos, trouxeram o reconhecimento universal da grandeza da nação. É a data dedicada aos heróis.

Em Cabo Verde, o 13 de Janeiro, o dia da Liberdade e Democracia, o 20 de Janeiro, o dia dos heróis nacionais e o 5 de Julho, o dia da independência, são os três grandes feriados civis. A celebração desses dias nacionais ainda carece da unanimidade necessária para se tornarem momentos revigorantes da república. Este ano, pela primeira vez, o Presidente da República observou com solenidade o dia 13 de Janeiro. A Assembleia Nacional, porém, ainda se recusa a referenciar o dia que marca a sua própria existência como órgão de soberania plural constituída por deputados da nação eleitos livremente em listas pluripartidárias. Uma incongruência que urge pôr um fim definitivo.

O espectro do regime de partido único ainda ensombra os caminhos que ligam o desejo da Liberdade à conquista da Independência e à instauração da Democracia. Procura apresentar-se como necessidade histórica e justificar-se com indispensável para a defesa da independência. Nada mais falso. Foi uma opção que suprimiu por 15 anos a Liberdade.

Os vinte e um anos de democracia já provaram que a Liberdade e a Independência só são preservados se os direitos do indivíduo são respeitados, se a soberania popular legitima o Poder político e se há sucesso na construção do Estado de Direito. A tragédia da Guiné-Bissau onde se misturam golpes, guerras, invasões e permanência de tropas estrangeiras é elucidativa a esse respeito. A lealdade de todos os órgãos de soberania para com os princípios que regem a república e constituem o sustentáculo das instituições deve ser claro e inequívoco. A liberdade e a estabilidade do país assim o exigem.

O dia dos heróis nacionais completa os outros dois feriados nacionais. A comemoração do dia deve ser um momento de exaltação dos valores neles consubstanciados e que levaram indivíduos em momento diferentes da história do país a fazer os maiores sacrifícios e a realizar os maiores feitos para que a Nação fosse livre e o futuro pertencesse a todos os seus filhos. Deve ser também um momento de demonstração de gratidão para os que tanto deram para a sua colectividade sem expectativa de recompensa em riquezas e poder sobre os seus semelhantes.

Editorial do jornal "Expresso das Ilhas" de 18 de Janeiro 2012

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