Da ministra de Finanças o
país já se habituou a ouvir declarações categóricas do género “a DGCI estará em
condições de iniciar os pagamentos (do IUR) na segunda quinzena de Novembro
(2012)”, que depois não têm tradução em actos reais e concretos. No passado
recente fez o discurso da blindagem, na sequência da crise internacional, com
o mesmo fervor e certeza que posteriormente iria colocar no discurso de aumento
brutal do IVA na água, energia, transportes e comunicações e na criação de
novas taxas para fazer face à mesma crise. Em entrevista ao jornal “Asemana”,
há quatro meses atrás, a ministra garantiu que a “estrutura (da DGCI) necessária, incluindo a
aplicação, os procedimentos e o savoir-faire, está pronta”. Hoje, no relatório
do FMI, sabe-se que a DGCI vive um caos administrativo. A questão que se põe é em quê acreditar.
Já havia sinais que a imagem
de rigor projectada pelo ministério das Finanças e Planeamento não condizia
com a prática. Para a imagem de competência muito contribuiu o aumento
extraordinário das receitas do Estado de 2004 a 2008 e as proclamações oficiais
que punham ênfase na qualidade das despesas. A realidade, porém, como comprova
o relatório do FMI, é que o aumento deve mais à adopção do IVA e à dinâmica
económica do “tempo das vacas gordas” do que a uma maior eficácia da
administração fiscal. Aliás, foi durante esse período que o grupo de quadros
que fora preparado para o IVA se dispersou e as reformas preconizadas em 2004,
para consolidar a DGCI, não se concretizaram. Por outro lado, a suposta
qualidade das despesas revelou ser mais gorduras do Estado e despesas rígidas
dificilmente sustentáveis em tempo de vacas magras e ainda por cima feitas com
rigor discutível. Prova disso foram os fundos transferidos para associações e
outras entidades nas vésperas das eleições presidenciais. Na época
constituíram objecto de denúncias públicas, em particular de círculos próximos
do partido no governo, mas apoiantes do candidato não sancionado pela cúpula do
partido.
Com a crise as consequências
de não se ter uma máquina tributária à altura fizeram-se sentir em força.
Segundo o FMI, as receitas caíram devido não só à quebra da actividade
económica, mas também porque a DGCI não dispunha de meios humanos e da expertise necessária para fazer os
contribuintes em geral e principalmente os mais fortes cumprir plenamente a
lei. No processo, a relação com os contribuintes piorou por falta de capacidade
de resposta, particularmente no que respeita às restituições do IUR e às
devoluções do IVA. Os cidadãos e as empresas sentiram-se prejudicados no seu
rendimento disponível e na sua liquidez e capacidade de investir, enquanto o
Estado pelas suas próprias palavras (OE 2013) confessava estar a financiar-se
gratuitamente com o IUR não restituído. A reacção nefasta do governo perante o
que é de facto resultado de má gestão da sua administração não ficou por aí.
Procurou superar as deficiências da administração fiscal alargando as fontes de
receitas com novos impostos e actualizações de taxas. É evidente que a
competitividade das empresas e do país não poderia deixar de sofrer com os
custos e ineficiências daí resultantes.
O relatório põe a nu várias
opções do governo prenhes de consequência. Um aspecto vital citado é o dos
recursos humanos. A administração fiscal exige quadros altamente qualificados e
motivados. Qualificados para estarem à altura da complexidade do sistema e
poderem responder às necessidades dos contribuintes e também dissuadir os
tentados a contratar consultores na perspectiva de contornar obrigações fiscais. Motivados não só no
ambiente de trabalho como também na remuneração porque considerando os valores
em jogo é de se prevenir situações que podem conduzir a favorecimento e mesmo
corrupção. Ora o que diz o FMI é que a qualificação e motivação na DGCI estão
muito aquém do desejável. Não há carreira porque não se fazem concursos
públicos. Pessoas com mesma formação e perfil são pagos de forma diferenciada
sem que haja razões objectivas para isso. Quadros dirigentes com deficiente
capacidade de gestão e planeamento
tendem a funcionar como .bombeiros.procurando responder a solicitações de
outros sectores do ministério e de contribuintes.
Um outro aspecto grave que o
documento aponta é o do sistema informático e a relação com o NOSi. Têm sérias
dúvidas quanto à adequação da aplicação utilizada e estranham que aos
utilizadores não é dado formação apropriada nem mesmo um manual para se
orientarem. Resultado disso é o atraso de anos na construção de cadastros dos
contribuintes e as dificuldades em obter do sistema recursos que por um lado
facilitem a vida dos cidadãos e empresas na relação com o fisco e por outro
permitam à DGCI detectar incumprimentos, fraudes e tentativas de evasão fiscal.
Perante tudo isto, várias
questões se colocam: será que o que se passa no ministério das Finanças é
espelho do que acontece noutros ministérios? A administração pública
encontra-se no mesmo estado da DGCI quando à qualificação e motivação dos seus
quadros e capacidade de planeamento da sua actividades? O NOSi, no qual tanto
se tem investido, presta serviço a outros sectores do Estado da mesma forma
como faz à DGCI descrita no relatório do FMI? Por onde anda a boa governação? O
governa que esclareça o país.
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