sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Mordaças nos telemóveis

O impacto do silenciamento dos telemóveis como plataforma de troca de informações entre indivíduos e grupos com vista a acção comum torna-se mais notório com o aproximar da campanha para as eleições legislativas. Ninguém está recorrer aos SMS´s de forma como se fez nas autárquicas de 2008. E não é por falta de esforço dos partidos concorrentes em fazer uso dos meios mais modernos de comunicação, designadamente a internet e as redes sociais como a Facebook, para chegar aos eleitores. Só não exploram as potencialidades oferecidas pelos telemóveis, considerando que há cerca de trezentos mil utilizadores no em Cabo Verde, é porque estão impedidos pela ANAC. Com uma deliberação, a agência reguladora das comunicações, bloqueou o uso de pequenas mensagens, SMS, como meio de mobilização e coordenação de acções de indivíduos e grupos. Justificou a proibição citando o incómodo de alguns utilizadores em receber mensagens não solicitadas. Só aos operadores de telecomunicações e a certas institucões deixaram essa prerrogativa. Aos operadores talvez para garantir o seu apoio essencial no condicionamento do acesso e aos outros possivelmente só para mostrar que não há motivações escondidas. O problema é que essas posições de autoridades não são nem inócuas nem inéditas. Num artigo da prestigiada revista americana “Foreign Affairs” de Janeiro de 2011 sob o título “O poder político dos Media sociais” O professor da Universidade de Nova Iorque Clay Sherky escreve que “a resposta das autoridades ao aparecimento novas formas de comunicação acessível a todos é apertar na censura e investir na propaganda. Nesse sentido, o controlo da capacidade de troca de mensagens, abrangendo o universo dos utilizadores dos telemóveis, não deixa de ser uma medida tentadora, por uma razão simples: evita acções conjuntas e coordenadas de cidadãos para serem ouvidos, para informarem e serem informados , para participarem em eventos de toda a espécie ou para pressionarem e influenciarem as autoridades. A experiência recente do activismo social e político no Irão, mas também na Bielorrússia, Ucrânia, Coreia do Sul, Chile e Filipinas, em que o poder do telemóvel e dos SMS´s ficou patente, não deixou de chamar a atenção das autoridades em muitos países que não vêem com bons olhos a autonomia dos indivíduos e da sociedade civil face ao Estado. Governos recorrem permanentemente aos meios poderosos da rádio e da televisão para fazer valer o seu ponto de vista, sem contraditório à altura. Quando aparece um meio como o telemóvel, que a todos possibilita dar e receber informações directamente sem controlo do Estado, sentem-se ameaçados. Mas as liberdades de expressão, de informação e de reunião são essenciais para o exercício da cidadania e para o funcionamento da democracia. Os únicos limites que a Constituição as impõe são as que explicitamente estabelece. Às autoridades não são permitidas que alarguem as restrições, sob que razão for. O bloqueio dos SMS broadcasting configura o que o professor Clay Sherky considera de atentado ao direito de informar e ao direito de reunião, com impacto directo na participação política dos cidadãos e na capacidade de “empoderamento” dos indivíduos e da sociedade civil caboverdiana. E os efeitos desse bloqueio sentem-se: A mão do Estado, e de quem a controla, vai para as eleições mais pesada e influente do que devia. A guerra que o Governo moveu contra os outdoors da Oposição, ao mesmo tempo que teimosamente mantinha os seus, não obstante a Lei e as posições da CNE, confirma o que o referido artigo do “Foreign Affairs” considera a típica reacção das autoridades ao maior protagonismo dos cidadãos e da sociedade civil derivado do uso dos novos media sociais: censura e mais propaganda.

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